Será que vale pagar um pouco?
Cesar Cruz, escritor e blogueiro, veio com uma pergunta muito interessante. Dado que as editoras estão com cada vez mais dificuldade de investir em novos autores, achando cada vez mais árduo colocar livros de brasileiros não famosos nas livrarias, será que não vale a pena fazer uma parceria e pagar um pouco pela edição?
Ele argumenta que as coisas mudaram um pouco e que já existem intermediários entre os prestadores de serviço simples, que publicam qualquer coisa, e os editores de verdade, que pagam por tudo o que publicam.
No meio deles teriam surgido, por necessidade, os editores que cobram um pouco do autor, mas não aceitam qualquer original.
Que triam a qualidade do que chega e que distribuem esses livros feitos em parceria com o autor da mesma forma que seus títulos comuns, dando a eles o tratamento das obras não pagas pelos autores.
Pode ser.
O mercado está em transformação, é verdade. Transcrevo abaixo os comentários de Cesar e deixo para discussão aqui.
Só aponto para o seguinte: é muito difícil o autor distinguir um editor bem intencionado de um prestador de serviços apenas interessado em fazer qualquer coisa pelo seu dinheiro. Sugiro sempre discutir com cuidado as formas e estratégias de distribuição, prestando atenção nos detalhes sólidos, não nas promessas.
Eis o que diz o Cesar:
Prezada Laura,
De tanto procurar editoras que publicassem o que escrevo (contos e crônicas), mandar originais aos montes, conversar com editores pessoalmente e por telefone, fui começando a perceber essa mudança…
De certa forma é natural, visto que os editores estão, cada dia mais, percebendo que vender livro no país do BBB não é fácil, ainda mais se forem livros de gente desconhecida como eu e milhares de escritores que há por aí.
Como me disse um editor ano passado, após ler meu original do livro de crônicas:
“Cesar, li pessoalmente seu original e ri muito, me diverti e achei muito bem escrito, porém, veja, para se publicar um autor, não se trata propriamente de ser bom ou mau o material desse autor.
Se trata, principalmente, de se saber se haverá ou não uma procura suficiente que me permita, pelo menos, atingir o ponto de equilíbrio do investimento…”
Como eu o havia perguntado a respeito de um livro de crônicas que eles tinham lançado há pouco, de uma certa cantora de uma certa banda de rock nacional, ele, entendendo que eu sutilmente estava criticando a qualidade das crônicas ali publicadas (que são de fato sofríveis, a maioria), ele completou dizendo mais ou menos o seguinte
“Entre um excelente livro de crônicas de um ilustre desconhecido e um livro com as crônicas ruinzinhas de um artista famoso, prefiro publicar o segundo, mesmo que eu tenha que pegar meu melhor revisor, aquele que é capaz de opinar na estruturação de forma a melhorar o texto, e dizer a ele ‘faça o que for possível para podermos publicar isto!’ E publicamos e pronto.
Só o público do artista garantirá uns 1000, 2000 exemplares, e assim eu chego ao menos no meu ponto de equilíbrio dos custos…”
Sendo assim tão difícil vender livros por aqui, Laura, entendo que algumas editoras comecem a criar selos para publicar a turma que escreve e quer ser publicada, mas que não vai mesmo vender, e por isso não vai ser aceita comercialmente. Mas que já não topa mais pegar 500 exemplares e levar pra casa. Não, esse novo e antenado autor quer estar na praça!
Então, nesse formato, o cara paga, mantém os direitos sobre a obra, a editora publica e distribui pelos canais normais da editora e, ao fim e ao cabo, acabam que ganham $ do mesmo jeito, só que de forma diferente.
Veja só: este meu segundo livro publiquei pela PONTES Editores, de Campinas. Editora que conheci através de um amigo, escritor conhecido e renomado, o Eustáquio Gomes.
Trata-se de uma editora comercial que, há pouco tempo, começou a lançar autores pagantes. Claro que, diferentemente da maioria das editoras que publicam sob demanda, aqui em SP (a maioria publica qualquer coisa, desde que se pague), eles não publicam antes de avaliar se o material não é tão ruim que mancharia a marca da empresa.
Feito isso, a coisa flui como se fosse um lançamento comercial: revisão, capa, discussão sobre miolo, gráfica, lançamento e distribuição.
A Pontes começou a fazer isso a tão pouco tempo que nem criou ainda um selo exclusivo. Lança pelo mesmo selo.
Eu, que acabei ficando amigo deles, dei minha sugestão que parece que eles vão aceitar: sugeri que se mantenha isso. Manter o mesmo selo para todas as publicações, tanto as comerciais quanto as pagas, bastando que não se publicasse (por $ nenhum!) material ruim.
Mostrei a eles que, criar um selo especial para “pagantes”, poderia malograr a obra pagante, colocando-a num plano inferior, não só de status de mercado, como de aceitação pelo próprio leitor.
Veja que no site da Pontes eles não fazem nenhum tipo de chamada do tipo “publique seu livro”. Para alavancar esse tipo de negócio, eles têm trabalhado basicamente com indicações.
Quanto à minha satisfação, sim estou satisfeito. Veja que lancei meu livro em novembro, e já o encontrei fisicamente em muitas livrarias e redes do país (Cultura, da Vila, Curitiba, Leitura etc. Mês de fevereiro estarei na Saraiva e tantas outras).
Claro que não é uma distribuição de Record, Cia das Letras, naturalmente, pois a Pontes é pequena, porém estou nos mesmos locais em que estão os lançamentos comerciais da editora.
E era isso que eu queria! Porque agora a coisa é comigo e com a atratividade do meu livro e qualidade do meu texto. Bem ou mal, estou vendo meu livro ser vendido (pelo menos exposto) para gente que nem conheço, em praças que eu nunca chegaria sozinho.
Ah, um detalhe: as editoras sob-demanda produzem um material de qualidade inferior (capa sem verniz, por exemplo, colagem só com cola…), já as comerciais, que estão habituadas com outro nível de qualidade, fazem um trabalho bem superior. O meu é um bom exemplo,quem viu meu livro comentou.
Duas outras editoras, além da Pontes, que sei que estão fazendo isso:Giz Editorial – publicam sob demanda e comercialmente, e distribuem pelos mesmos canais. Porém não há critério (pagando, publicam qualquer horror) Novo Século – publica comercialmente, mas tem um selo exclusivo, o Novos Talentos, para a turma sob demanda. Porém, não publicam qualquer coisa. Fazem uma criteriosa avaliação, segundo o que me disseram.
Veja que, com pequenas diferenças, essas empresas estão enxergando um mercado interessante: o mercado do autor de boa qualidade, e que por questões de mercado, não conseguiria ser lançado comercialmente, mas que está disposto a pagar (ou tem um patrocinador que pague, meu caso específico), porém exige ser distribuído na praça, como gente grande.
Empresas como a Scortecci, de SP, entre dezenas de outras, que rodam seu livro, te entregam na mão e dizem “vire-se”, ainda são a maioria, mas aí já vemos uma mudança, não é? Os autores estão ficando sabidos, Laura, e os editores também. Este novo formato, se vingar, será bom para todos: autores, editores e leitores.
Creio que deve haver muitas outras editoras fazendo isso Brasil a fora. Se eu souber de novidades, te aviso. Se você ou qualquer dos seus leitores precisar de mim, me escreva.
Cesar Cruz
S. Paulo/ SP
21 de janeiro de 2022 @ 08:18
Gostei muito, do que já li aqui… Quanto ao que escrevo, faço para mim. Em tudo devemos arriscar, apresentar o que gostamos de fazer é sempre bom! Mesmo que alguém não goste.
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