Equilíbrio emocional
Recebo centenas de emails todos os meses de pessoas desejosas de serem publicadas e noto um traço que se repete: emoções que parecem um tanto fora de controle.
A escrita é uma atividade exemplar de movimentação interna, de algo que se faz por razões próprias.
Se você não coloca suas emoções em equilíbrio, dificilmente conseguirá escrever algo que preste ou até o fim.
Antes de criar, você precisa se colocar em posição de criador/a.
Eu não me arvoro de jeito nenhum em propagadora de auto-ajuda, mas como editora sei de atitudes e posturas que não funcionam. Comento aqui as mais comuns.
Arrogância
Editores são alérgicos a quem chega dizendo que é o tal, que faz e acontece. Pior, que chega dando ordens, achando que deve ser obedecido simplesmente porque escreveu (ou planeja) uma obra que, na sua concepção, é fantástica, genial, bestseller garantido.
Existem áreas da vida em que se comportar como super assertivo dá certo, mas a publicação de livros não é uma delas. Confiança em si é bom, mas querer que pessoas independentes e cheia de critérios como editores se curvem à sua vontade não é produtivo.
Faz parte dessa atitude emocional inadequada fazer pedidos enormes, sem oferecer nada em troca. Meu querido, minha querida, por que profissionais vão ler e comentar a sua obra? Dar dicas detalhadas? Acompanhar seu processo passo a passo? Isso tudo é trabalho, um monte de trabalho. É achar que o mundo gira a seu redor sair pedindo ou exigindo isso dos outros.
Não recomendo.
Insegurança
Do outro lado do espectro, há aquele monte de escritores que se acha incapaz, inadequado, que nunca vai conseguir ser publicado.
Assim como a arrogância aborrece, a insegurança incomoda os editores. Se você escreve, tem que cultivar o mínimo de coragem de se expor, o mínimo de auto-estima e confiança em si mesmo/a.
A escrita não é uma atividade neutra, e quando funciona costuma provocar tanto elogios quanto críticas. Você tem que se habituar com isso e posicionar-se com uma certa assertividade.
Curiosamente, o que noto entre escritores é que aqueles que mais se encolhem e têm medo costumam ser justamente aqueles que mais têm algo a dizer.
Faz parte dessa atitude emocional inadequada achar a priori que o texto não será publicado por nenhuma editora e sequer se dar ao trabalho de oferecê-lo. Lidar com editoras pode ser frustrante e desgastante, eu sei, mas, se você tem certeza de que não vai conseguir antes de tentar, está dando tiro no pé.
Não recomendo.
Imaturidade
Tudo bem que esta nossa época incentiva e vende a gratificação imediata, mas eis uma atividade que não é instantânea. Se você quer resultado agora ou daqui a pouco, não se meta a escrever.
Criar um texto demanda técnicas e experiências demoradas, e tentar publicá-lo exige paciência e jogo de cintura. Não é para qualquer um e certamente não vai acontecer de hoje para amanhã.
Caso você tenha prazer em criar histórias ou acredite que tem algo de importante a dizer para outras pessoas, dedique-se. Aprenda a comunicar-se de forma clara e interessante. Entenda como funciona o mercado de livros. Leia muito. Dê passos no caminho da profissionalização.
Uma das razões pelas quais tantos mais autores estrangeiros são publicados que nacionais é a total falta de profissionalismo de grande parte dos brasileiros.
Enquanto americanos e franceses, por exemplo, entendem perfeitamente que um texto precisa ser trabalhado e retrabalhado, afinado para um determinado público, editado, enquanto fazem cursos de escrita e contratam editores de texto, brasileiros com frequência acham que a primeira expressão da primeira ideia que lhes passa pela cabeça merece ser publicada.
Não funciona.
Ansiedade
Tem escritores ainda que querem respostas, querem saber o que acontece, querem ter controle do processo de publicação. São uma praga odiada por editores porque, quando aceitos, incomodam todo o pessoal da produção e em nada contribuem para o sucesso do livro. Quando o original de um ansioso está em análise, a própria insistência em saber o que se passa pode levar a uma recusa.
Cultive a calma. Boa parte do que movimenta a publicação de livros depende de sorte, do momento, da conjunção de fatores que ninguém controla.
Portanto, tentar abarcar isso é perda de tempo e energia, além de aborrecer os envolvidos. Sim, há uma série de providências que podem ser tomadas para garantir a qualidade de uma obra, como escrever bem e de modo focado, mas nenhuma que dê a certeza de que será aceita para publicação nem que terá sucesso uma vez publicada. A atividade da escrita envolve risco e a de publicação mais ainda.
Aceite isso e cultive uma postura zen.
Dureza
Encontro autores ainda que acham que a escrita é uma atividade que pode ser programada: tantas páginas por dia e em tanto tempo terei um texto pronto para virar livro. Enquanto uma certa disciplina é muito útil, não há dúvida, já que a escrita é uma atividade auto-induzida e individual, excesso de rigidez não produz bons resultados.
Escrever é um ato de criatividade e funciona melhor com uma certa soltura, um pouco de leveza para que as ideias ou imagens fluam. Chicote funciona para ir à academia puxar ferro, mas não para escrever x número de páginas. Pelo menos não para escrever bem x número de páginas.
Se você gosta de rotina e aprecia ambientes mais controlados, crie sim o hábito de escrever sempre no mesmo horário, mas não espere resultados muito fixos. E não se cobre demais, pois o que você julga como fracasso talvez seja o meio de um belíssimo processo de crianção que ainda não reverteu em número de páginas.
Estude o que outros escritores dizem sobre isso e vai ver inúmeros exemplos.
Preguiça
O oposto da atitude acima também é comum e também atrapalha horrores. Sim, eu sei que estamos na sociedade do mínimo pelo máximo, do fazer pouco esforço para receber grandes prêmios, mas confesso que não conheço muitos escritores preguiçosos publicados.
Escrita, como venho repetindo, é um ato individual e depende muito do esforço e da atenção que você coloca nele. Claro, há talentos inatos, mas mesmo o texto destes ganha quando trabalhado, e os leitores (e editores) percebem quando houve cuidado e quando não houve. Você até tem como contratar serviços externos como o de revisão, mas dificilmente um texto medíocre ficará bom com a ajuda de profissionais que não o autor do texto. Pode ficar razoável, mas não bom.
O resumo da ópera é que, se você quer escrever, precisa se dedicar. Aprender, aprimorar. Você precisa ser a parte principal do processo, a mola propulsora. Não são os outros que vão escrever seu texto, mas você.